Fonte:Correio Popular/ Eduardo Mansur-
Medo. Esse é um sentimento comum aos caminhoneiros que circulam à noite pela Região Metropolitana de Campinas (RMC). Além das histórias de assalto contadas pelos motoristas, o receio de ser mais uma vítima dos ladrões tem origem ainda nos números oficiais de roubos de carga divulgados pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP). No primeiro trimestre deste ano, por exemplo, essas ocorrências tiveram um aumento de 22,3% na região, em comparação com o mesmo período de 2016.
Nos três primeiros meses deste ano ocorreram 148 casos relacionados ao roubo de carga ante 121 no mesmo período de 2016. Apenas nos trechos da cidade de Campinas os índices recuaram de janeiro a março, em 17,8 %. Ainda assim, houve um aumento de 4,1% no roubo de cargas dentro dos limites do município entre 2014 e 2016
Durante a pausa para o almoço em um posto de gasolina na Via Anhanguera, em Campinas, o caminhoneiro Wellington Rosa confirma as estatísticas. “É bem inseguro aqui, é uma área de risco. Já tive amigos assaltados”, revela, dizendo ainda que as seguradoras orientam aos motoristas evitar parar à noite. Mesmo assim, as quadrilhas não poupam esforços para realizar os assaltos. “Quando não pegam a gente estacionado em algum refúgio da rodovia, eles encostam e dizem que está caindo alguma coisa do caminhão ou que o veículo está com algum problema. Eles também usam vários carros e fecham a pista, obrigando a gente a parar”, conta o caminhoneiro.
Gilberto Caetano, funcionário de uma empresa de logística com sede na Capital paulista, costuma realizar entregas na RMC. “À noite é o pior horário. Hoje em dia tem muita gente de moto. O cara encosta do seu lado e já aponta a arma. É muito fácil”, diz ele, que dirige um veículo utilitário para encomendas expressas. “Costumo trabalhar também em Minas Gerais, que é mais tranqüilo. Mas evito pegar roteiros que passem pelo Rio de Janeiro. Lá também é terrível”, atesta Caetano.
Somente de 2011 até o ano passado, o País registrou 97.786 ocorrências do tipo, de acordo com a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Conforme relatório divulgado pela entidade, o prejuízo acumulado no período chega a R$ 6,1 bilhões.
Segurança privada
Para evitar as perdas, as empresas de logística recorrem cada vez mais à segurança privada. Somente no Estado de São Paulo, a demanda pelo serviço de escolta cresceu cerca de 20% nos últimos 18 meses, de acordo com o Sindicato das Empresas de Escolta do Estado (Semeesp). “Logicamente, o aumento da criminalidade contribui para o crescimento do setor”, diz o vice-presidente da instituição, Paulo Rogério Rizzo.
De acordo com caminhoneiro Washington Lima, os ladrões estão visando também outras mercadorias que sejam rentáveis e fáceis de serem repassadas. “Outro dia roubaram uma carga de desodorantes aqui na região. Os bandidos também gostam de carga de cerveja”, revela o motorista, que confirma ainda o aumento no custo do frete por causa dos perigos nas rodovias.
Custos
Todos os gastos com segurança e seguros, cada vez mais altos, encarecem os serviços de transporte. Segundo Pedro Lopes, presidente da Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga (ABTC), o repasse pode chegar a até 40% sobre o valor original do frete. “Esse custo é passado para a frente e influi diretamente no valor final do produto transportado”, comenta o dirigente da ABTC.
Segundo ele, o problema dos assaltos não se limita à questão financeira. “Há também um prejuízo moral, que deixa marcas nas vidas do caminhoneiro e do empresário.” Lopes ressalta ainda que os saques ocorridos depois dos acidentes envolvendo caminhões não entram nas estatísticas das secretarias de segurança pública, mas também causam grandes perdas ao setor. “Carregamentos com alimentação, bebidas e medicamentos são totalmente perdidos. O prejuízo é inestimável. O que não é de consumo imediato da população entra no círculo da economia informal, sem controle de tributos. Perdemos todos”, complementa o presidente da ABTC, destacando ainda que é preciso estabelecer projetos de segurança para coibir os assaltos.
É o que diz também o ex-delegado de polícia, o advogado Ruyrillo Pedro Magalhães. Segundo ele, o policiamento ostensivo nas rodovias ajuda, mas não resolve o problema. A solução estaria nas investigações, o que poderia desmantelar as quadrilhas especializadas. “É preciso trabalhar com inteligência. Fazer observação, filmagens, ficar de campana. A polícia também precisa ter informantes. Mas tudo isso demanda tempo, estímulo e efetivo, algo que não se tem hoje em dia.”
Foi usando a inteligência que policiais civis de Paulínia estouraram um desmanche de caminhões em Santa Bárbara d’Oeste no início do ano. Além de encontrar uma grande quantidade de autopeças, os agentes prenderam nove suspeitos.
Mas, enquanto persiste o perigo nas estradas, o caminhoneiro Washington Lima traça sua própria estratégia. “Procuro parar em locais seguros. E, quando paro, é sempre perto da Polícia Rodoviária. Quando dá, mudo meu caminho para evitar algum ponto crítico”, conta o motorista, que já teve um amigo morto durante um assalto.
Polícias Civil e Rodoviária unem ações
A Secretaria de Estado da Segurança Pública informou, por meio de nota, que a Polícia Civil de Campinas vem realizando operações em parceria com a Polícia Rodoviária Federal com o objetivo de identificar os criminosos ligados aos roubos de carga. Neste ano, a Delegacia de Investigações Gerais da cidade prendeu 17 pessoas em flagrante, além de confiscar armas e munições. De acordo o balanço parcial, oito cargas roubadas foram recuperadas. (JEM/AAN)